Ap 11,19a; 12,1.3-6a.10ab
Sl 44
1Cor 15,20-27a
Lc 1,39-56
Esta é a maior das festas da Santíssima Virgem Maria; é a sua Assunção; a festa da sua entrada na glória, da sua
plenitude como criatura, como mulher, como mãe, como discípula de Cristo Jesus. Como um rio, que após longa corrida deságua no mar, hoje, a Virgem Toda Santa deságua na glória de Deus: transfigurada no Espírito Santo, derramado pelo Cristo, ela está na glória do Pai!
Para compreendermos o profundo sentido do que celebramos, tomemos as palavras de São Paulo: “Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram. Com efeito, por um homem veio a morte e é também por um homem que vem a ressurreição dos mortos. Como em Adão todos morrem, em Cristo todos reviverão. Porém, cada qual segundo uma ordem determinada”. – Eis a nossa fé, o centro da nossa esperança: Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que adormeceram. Ele é o primeiro a ressuscitar, ele é a causa e o modelo da nossa ressurreição. Os que nele nascem pelo batismo, os que nele crêem e nele vivem, ressuscitarão com ele e como ele: logo após a morte ressuscitarão naquela dimensão imaterial que temos, núcleo da nossa personalidade, a que chamamos “alma”; e, no final dos tempos, quando todo o universo for glorificado, ressuscitaremos também no nosso corpo. Assim, em todo o nosso ser, corpo e alma, estaremos, um dia, revestidos da glória de Cristo, nosso Salvador, estaremos plenamente conformados a ele!
Ora, a Igreja crê, desde os tempos antigos, que a Virgem Maria já entrou plenamente nessa glória. Aquilo que todos nós só teremos em plenitude no final dos tempos, a Santíssima Mãe de Deus, já recebeu logo após a sua morte. Ela é a “Mulher vestida de sol, tendo a lua debaixo dos pés e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas”. Ela já está totalmente revestida da glória do Cristo, Sol de justiça – e esta glória é o próprio Espírito Santo que o Cristo Senhor nos dá. Ela já pisa a lua, símbolo das mudanças e inconstâncias deste mundo que passa. Ela já está coroada com doze estrelas, porque é a Filha de Sião, filha perfeita do antigo Israel e Mãe do novo Israel, que é a Igreja. Assim, a Virgem, logo após a sua morte – doce como uma dormição -, foi elevado ao céu, à glória do seu Filho em todo o seu ser, corpo e alma. Aquela que esteve perfeitamente unida ao Filho na cruz (cf. Lc 2,34s; Jo 19,25ss), agora está perfeitamente unida a ele na glória. São Paulo não dissera, falando do Cristo morto e ressuscitado? “Fiel é esta palavra: Se com ele morremos, com ele viveremos. Se com ele sofremos, com ele reinaremos” (2Tm 2,12). Eis! A Virgem que perfeitamente esteve unida ao seu Filho no caminho da cruz, perfeitamente foi unida a ele na glória da ressurreição. Aquela que sempre foi “plenamente agraciada” (Lc 1,28), de modo a não ter a mancha do pecado, não permaneceu na morte, salário do pecado. Assim, o que nós esperamos em plenitude para o fim dos tempos, a Virgem já experimenta agora e plenitude. Como é grande a salvação que o Cristo nos obteve! Como é grande a sua força salvífica ao realizar coisas tão grandes na sua Mãe!
Mas, a Festa de hoje não é somente da Virgem Maria. Primeiramente, ela glorifica o Cristo, Autor da nossa salvação, pois em Maria aparece a vitória sobre a morte, que Jesus nos conquistou. A liturgia hoje exclama:“Preservastes, ó Deus, da corrupção da morte aquela que gerou de modo inefável vosso próprio Filho feito homem, Autor de toda a vida”. Este senhorio de Cristo aparece hoje radiante na sua Mãe toda santa: em Maria, Cristo venceu a morte de Maria! Em segundo lugar, a festa de hoje é também festa da Igreja, de quem Maria é Mãe e figura. A liturgia canta: “Hoje, a Virgem Maria, Mãe de Deus, foi elevada à glória do céu. Aurora e esplendor da Igreja triunfante, ela é consolo e esperança para o vosso povo ainda em caminho”. Sim! A Mãe Igreja contempla a Mãe Maria e fica cheia de esperança, pois um dia, estará totalmente glorificada como ela, a Mãe de Jesus, já se encontra agora. Finalmente, a festa é de cada um de nós, pois já vemos em Nossa Senhora aquilo que, pela graça de Cristo, o Pai preparou para todos nós: que sejamos totalmente glorificados na glória luminosa do Espírito do Filho morto e ressuscitado. Aquilo que a Virgem já possui plenamente, nós possuiremos também: logo após a morte, na nossa alma; no fim dos tempos, também no nosso corpo!
Estejamos atentos! A festa hodierna recorda o nosso destino, a nossa dignidade e a dignidade do nosso corpo. O mundo atual, por um lado exalta o corpo nas academias, no culto da forma física, da moda e da beleza exterior; por outro lado, entrega o corpo à sensualidade, à imoralidade, à droga, ao álcool… É comum escutarmos que o que importa é o “espírito”, que a matéria, o corpo passa… Os cristãos não aceitam isso! Nosso corpo é templo do Espírito Santo, nosso corpo ressuscitará, nosso corpo é dimensão indispensável do nosso eu. Um documento recente da Igreja sobre a relação homem-mulher, chamava-se atenção exatamente para essa questão: o corpo em si, para o mundo, parece que não significa muita coisa, que não tem uma linguagem própria, que não diz algo do que eu sou, da minha identidade – inclusive sexual. Para nós, cristãos, o corpo integra profundamente a personalidade de cada um: meu corpo será meu por toda eternidade; meu corpo é parte de minha identidade por todo o sempre! Honremos, então nosso corpo: “O corpo não é para a fornicação e, sim, para o Senhor e o Senhor é para o corpo. Ora, Deus, que ressuscitou o Senhor, ressuscitará também a nós – em nosso corpo- pelo seu poder. Glorificai, portanto, a Deus em vosso corpo” (1Cor 6,14.20).
Então, caríssimos, olhemos para o céu, voltemos para lá o nosso coração! Celebremos! Com a Virgem Maria, hoje vencedora da morte, com a Igreja, que espera, um dia, triunfar totalmente como Maria Virgem, cantemos as palavras da Filha de Sião, da Mãe da Igreja, pensando na nossa vitória: “A minha alma engrandece o Senhor e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, porque olhou para a humildade de sua serva. O Todo-poderoso fez grandes coisas em meu favor!” A ele a glória pelos séculos dos séculos. Amém.
Hoje celebramos a maior de todas as solenidades da Mãe de Deus: a sua Assunção gloriosa ao céu.
A oração inicial da Missa hodierna pediu: “Deus eterno e todo-poderoso, que elevastes à glória do céu em corpo e alma a imaculada Virgem Maria, Mãe do vosso Filho, dai-nos viver atentos às coisas do alto, a fim de participarmos da sua glória”. A liturgia da Igreja, sempre tão sábia e tão sóbria, resumiu aqui o essencial desta solenidade santíssima. Com efeito, Deus elevou à glória do céu em corpo e alma a imaculada Virgem Maria! Ela, uma simples criatura, ela, tão pequena, tão humilde, foi eleva a Deus, ao céu, à plenitude em todo o seu ser, corpo e alma! Como isso é possível? Não é a morte o destino comum e final de tudo quanto vive? Isso dizem os pagãos, isso dizem os descrentes, os sábios segundo o mundo, que se conformam com a morte… Mas, nós, nós sabemos que não é assim! Nosso destino é a vida, nosso ponto final é a glória no coração de Deus: glória no corpo, glória na alma, glória em tudo que somos! Foi isso que Deus nos preparou – bendito seja ele para sempre!
Mas, como isso é possível? A Palavra de Deus deste hoje no-lo afirma, de modo admirável. Escutai, irmãos, escutai, irmãs, consolai-vos todos vós: “Cristo ressuscitou dos mortos, primícia dos que morreram. Em Cristo todos reviverão, cada qual segundo uma ordem determinada; em primeiro lugar Cristo, como primícia!” Eis por que, eis como ressuscitaremos: Cristo ressuscitou! Jesus de Nazaré, caríssimos, é o Senhor! O nosso Jesus é Deus bendito e foi ressuscitado pela glória do Pai! O nosso Senhor Jesus venceu e no faz participantes da sua vitória, dando-nos o seu Espírito Santo! Credes nisso, meus caros? Neste mundo que só crê no que vê, que só leva a sério o que toca, que só dá valor ao que cai no âmbito dos sentidos, credes que Cristo está vivo e é Senhor, primícia, princípio de todos os que morrem unidos a ele? Pois bem, escutai: o Cristo que ressuscitou, que venceu, concedeu plenamente a sua vitória à sua Mãe, à Santíssima Virgem Maria, que esteve sempre unida a ele. Ela, totalmente imaculada, nunca afastou-se do filho: nem na longa espera do parto, nem na pobreza de Belém, nem na fuga para o Egito, nem no período de exílio, nem na angústia de procura-lo no Templo, nem nos anos obscuros de Nazaré, nem nos tempos dolorosos da pregação do Reino, nem no desastre da cruz, nem na solidão do sepulcro no Sábado Santo… nem mesmo após, nos dias da Igreja, quando discretamente, ela permanecia em oração com os irmãos do Senhor… Sempre imaculada, sempre perfeitamente unida ao Senhor. Assim, após a sua preciosa morte, ela foi elevada à glória do céu, isto é, à glória de Cristo que ressuscitou e é primícia da nossa ressurreição!
A presente solenidade é, então, primeiramente, exaltação da glória do Cristo: nele está a vida e a ressurreição; nele, a esperança de libertação definitiva! Por isso, todo aquele que crê em Jesus e é batizado no seu Espírito Santo no sacramento do Batismo, morrerá com Cristo e com Cristo ressuscitará. Imediatamente após a morte, nossa alma será glorificada e estaremos para sempre com o Senhor. Quanto ao nosso corpo, será destruído e, no final dos tempos, quando Cristo nossa vida aparecer, será também ressuscitado em glória e unido à nossa alma. Será assim com todos nós. Mas, não foi assim com a Virgem Maria! Aquela que não teve pecado também não foi tocada pela corrupção da morte! Imediatamente após a sua passagem para Deus, ela foi ressuscitada, glorificada em corpo e alma, foi elevada ao céu! Podemos, portanto, exclamar como Isabel: “Bendita és tu entre as mulheres! Bendito é o fruto do teu ventre! Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu!”
Esta é, portanto, a festa de plenitude de Nossa Senhora, a sua chegada a glória, no seu destino pleno de criatura. Nela aparece claro a obra da salvação que Cristo realizou! Ela é aquela Mulher vestida do sol, que é Cristo, pisando a instabilidade deste mundo, representada pela lua inconstante, toda coroada de doze estrelas, número da Israel e da Igreja! A leitura do Apocalipse mostra-nos tudo isso; mas, termina afirmando: “Agora realizou-se a salvação, a força e a realeza do nosso Deus e o poder do seu Cristo!” Eis: a plenitude da Virgem é realização da obra de Cristo, da vitória de Cristo nela!
Caríssimos, quanto nos diz esta solenidade! A oração inicial, citada no início desta homilia, pedia a Deus: “Dai-nos viver atentos às coisas do alto, a fim de participarmos da sua glória dai-nos viver atentos às coisas do alto, a fim de participarmos da sua glória”. Eis aqui qual deve ser o nosso modo de viver: atentos às coisas do alto, onde está Cristo, onde contemplamos a Virgem totalmente glorificada em Cristo. Caminhar neste mundo sem no prendermos a ele. Aqui somos estrangeiros, aqui estamos de passagem, aqui somos peregrinos; lá é que permaneceremos para sempre: nossa pátria é o céu, onde está Cristo, nossa vida! O grande mal do mundo atual é entreter-se com seu consumismo, com sua tecnologia, com seu bem-estar, com seu divertimento excessivo e esquecer de viver atento às coisas do alto. Mas, pior ainda, os cristãos também muitas vezes são infectados por essa doença! Nós, que deveríamos ser as testemunhas do mundo que há de vir, quantas vezes vivemos imersos, metidos somente nas ocupações deste mundo – muitos até com o pretexto de que estão trabalhando pelos irmãos e por uma sociedade melhor. Nada disso! Os pés devem estar na terra, mas o coração deve estar sempre voltado para o alto! Não esqueçamos: nosso destino é o céu, participando da glória de Cristo, da qual a Virgem Maria já participa plenamente! Aí, sim, poderemos cantar com ela e como ela: “A minha alma engrandece ao Senhor e o meu espírito exulta em Deus meu Salvador: o poderoso fez em mim maravilhas!” Seja ele bendito agora e para sempre. Amém.